sexta-feira, 30 de julho de 2010

Dentro

Imagem de Laurie Simmons


Viver o cancro, morrer de cancro. Tenho medo da possibilidade. Dói-me, dentro da própria dor, ver também quem amo sofrer de cancro. Tenho medo. E só se espanta esse medo com o que é eterno. E eterno é o amor. Sim, o amor. Aquele amor inquebrável que, perante as adversidades, se fortalece. Porque esse amor existe. É obsceno, este amor: humilha quem vive relações de faz de conta.

A vida pode querer esboroar a fé no amor, pondo-nos à frente dos olhos relações em estilhaços. Multiplicam-se os finais de relações, nossas, dos outros ou de aqueloutros. Mas eu continuo a acreditar no amor. Não com a ingenuidade dos 19 anos, mas com a romântica lucidez dos 32.

Quero um amor como o dos meus pais. E quero que, um dia, um filho me abrace como eu abraço a minha mãe. E refile preocupadamente comigo como eu faço com o meu pai.

Saber que moramos no peito de alguém, saber que no abraço desse alguém nos sentimos em casa, sentir que, em redor do outro, podemos desvelar intimidade...haverá alguma coisa, além disto, que dê verdadeiro sentido à vida?



Viver

«Deixei de festejar os meus anos, não gosto destas coisas das datas. Não gosto de ter menos tempo do que já tive. Por isso, digo que a vida tem de ser larga, porque pode não ser comprida...»

Parece uma frase retirada do filme «Contraluz», mas o autor é mesmo António Mexia, presidente da EDP, em entrevista ao Expresso. A luz como denominador comum.

(à vida, além de largura, eu acrescentaria profundidade; e o Gonçalo M. Tavares, milagre...e este post fez-me lembrar um anterior)

A lição

Para António Feio, a aprendizagem sobre o que é isso de se ter cancro chegou ao fim. Passou com distinção.


«Não quero dar uma de herói. Sou um mariquinhas de caca como qualquer ser humano nestas condições. Tenho medo, tenho pavor. Mas não vou andar aqui a choramingar».

E não choramingou.
Morreu o homem, mas não morreu o exemplo.

sábado, 24 de julho de 2010

Ei-las

Imagem de Lane Coder


Aí estão as férias. Curtas, mas minhas.
Tudo o que quero:
o discreto rumor do estio.
vastidão.
sono sem a tirania do despertador.
leitura em silêncio.
trocar o eléctrico 28 pelo meu carro.
procurar o verde.
deitar a cabeça no colo materno.
O coração entre a doçura dos figos e as raízes dos girassóis.