domingo, 15 de março de 2009

Folhas secas

Imagem de Joan Kocak



Cada vez dou mais valor às pessoas que dão significado à minha vida. Cada vez dou mais valor a quem tenho e ao que tenho dentro de mim. E a quem traz dentro das suas vidas a minha família. Gosto-me cheia de emoções fortes. Às vezes despojada de palavras [como tem acontecido nestes últimos tempos]. E a valorizar, cada vez mais, o silêncio...e as doces interrupções de silêncio, 'impostas' pelo carinho dos amigos.

Tem havido dor, muita dor. Ver a tristeza, inquietação muda, no olhar da minha mãe. Ver a minha mãe a olhar para um corpo que, pela terceira vez, foi aberto no mesmo sítio. A doença como uma estranha que não pediu licença para entrar numa casa de carne e osso. A doença a esconder-se atrás de cortinas. Até um dia se comportar como elefante em loja de porcelanas. E surpreender. O estilhaço. O rasgão. Os agrafos. A costura.

A dor. A dor está-me a servir para colocar na devida ordem certas miudezas. Impõe-se uma imagem, ainda desfocada. Não vislumbro todos os contornos. Mas, sinto-me a abrir uma gaiola cheia de folhas secas. A sensação de estar na posse de uma gaiola de folhas secas, sabendo que a prisioneira afinal sou eu.

Quero deixar a gaiola vazia, de porta aberta. O tombo das folhas. Húmus.

Há dias, dei por mim a queimar, na lareira, todas as flores secas que encontrei cá em casa. Cada vez me parece mais incompreensível oferecer a alguém arranjos de flores secas. Gosto de ver o desabrochar das flores que a minha mãe tem semeado no jardim. Gosto das flores que, com o frio, adormecem, para voltar a despertar na primavera.

Flores secas estão ao nível do quadro do menino da lágrima. Pior só mesmo baptizar alguém com o nome de Maria das Dores.

7 comentários:

Susana Miguel disse...

(...) muito profundo,muito belo, muito intimo, daqueles textos que nos apetece abraçar(...)

abracinho.

Sininho disse...

Miúda um beijinho para ti ...

Robin K disse...

Muitas são as vezes que somos curados pela dor.

Ana disse...

Amiga....Um beijo Grande, muito grande mesmo.

Violet disse...

Que a dor tenha, apesar do imenso absurdo que nos pareça, um qualquer significado escondido. Que no limite da nossa imcompreensão, nos ensine, pelo menos, a importância de relativizar pequenos obstáculos.

Partilho contigo o sentimento por flores secas, de plástico, inertes. Sugiro as novas orquideas em vasos com terra. Que as vÊs crescer, evoluir, desabrochar. Um beijo. V.

Ice-device disse...

Tenho sentido o teu silêncio.
Mas estou cá na mesma.

Liliana Garcia disse...

Obrigada, obrigada a todos...pela presença, na distância.

Um beijinho solar para todos