Ele tinha um desejo: queria que a sua pele fosse palimpsesto; e ela copista do mais redivivo poema de amor. Ela fazia-o pestanejar ternura. Mas ele não conseguia deixar de olhar para ela e ver uma arma apontada à sua própria testa, ao seu próprio coração. Ele queria despir a armadura dos gestos, abrir o peito ao fogo disparado pela sua própria mão. Mas não conseguia.Queria premir o gatilho, estilhaçar aquilo em que se tinha tornado a sua vida: um mi(ni)stério da defesa. Queria abraçá-la, sem braço de ferro. Mas os pensamentos antecipavam-lhe o sabor a pólvora que escorreria do beijo que nunca deram.
Fugia do gatilho, em vão.
Ainda não se tinha apercebido de que a bala, já há muito, lhe navegava na corrente sanguínea.
1 comentário:
Caramba!!! Que intimidade você tem com as palavras. Que poética forma de ler um crime, uma coisa tão terrível.
Muito bom...
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